UMA REFLEXÃO SOBRE A VIABILIDADE DO CINEMA BRASILEIRO E A SUA CAPACIDADE DE SEDUZIR
O NOVO PÚBLICO: DO CIDADÃO AUDIOVISUAL ATIVO

O cinema brasileiro é viável financeiramente? E esteticamente? O que ele tem a dizer? O que falta para despertar o interesse de um público maior? Há hoje no Brasil um cinema que se possa considerar popular? Ou antes: faz sentido pensar em cinema popular com salas concentradas em shopping centers e um dos ingressos mais caros do mundo?

O mercado do cinema brasileiro e o cinema brasileiro de mercado foram vistos com lupa de 31 de outubro a 06 de novembro, em Belo Horizonte, na edição inaugural da Mostra CineBH 2007, novo esforço da Universo Produção em ajudar a conhecer, compreender e difundir o cinema nacional – a exemplo do que já faz, de forma diferenciada e complementar, nas edições anuais da Mostra de Cinema de Tiradentes [centrada na produção contemporânea, em janeiro] e na CineOP [que difunde o audiovisual como patrimônio, em junho, em Ouro Preto.

 Mais que uma mostra de filmes, a Mostra CineBH foi um espaço de reflexão sobre a sustentabilidade do cinema nacional e a sua capacidade de seduzir o público. Uma reflexão em palavras, por meio de debates, palestras e oficinas, mas sobretudo em imagens, em seleções variadas, distribuídas em três diferentes espaços de exibição que foram “construídos” pela organização do evento – a Vila do Cinema – no bairro Santa Tereza – que recebeu a infra-estrutura necessária para atender a programação oferecida gratuitamente ao público.

 Discussão e diversão convergiram para o tradicional e charmoso bairro de Santa Tereza, símbolo de uma vida cultural intensa que remonta décadas e agora reabilita um dos seus espaços mais tradicionais, o Cine Santa Tereza, cinema de bairro fundado em 1944 e desativado desde 1980. A Universo Produção instalou “uma operação” em tempo recorde de reconstrução do espaço físico do cinema para atender o evento que foi entreaberto provisoriamente.

 O Cine Santa Tereza foi a sede do evento e além da instalação de uma sala de exibição com 400 lugares na platéia para exibições diárias de longas e curtas, sessões cine-escola e mostrinha de cinema, abrigou também a administração, coordenação, logística, imprensa e foyer com o cine-bar-café.

Na Praça Duque de Caxias, foram instalados o Cine-Tenda (platéia de 300 lugares) para exibições de longas, curtas e vídeos, seminário e o Cine-Praça (platéia de 1.000 lugares) destinado à exibição de filmes ao ar livre, exposição temática e atrações artísticas.

 O legado acumulado pelo cinema feito nas Minas Gerais é desvelado pela exibição de obras de alguns de seus autores mais influentes, forjado no diálogo com os principais movimentos estéticos mundial, de uma perspectiva obtida pari passu, a partir de Belo Horizonte, capital fundada no exato ano da criação do próprio cinema, em 1898.

 Emerge também por meio de homenagens a personagens e passagens marcantes que deram substância ao pensamento audiovisual na cidade e no Estado –caso do CEC, o Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro, marco de um tempo de discussões acaloradas.

 A Mostra CineBH amplificou perguntas, compartilhou leituras, refinou o entendimento. O fenômeno da pirataria massiva de um longa atrelado à realidade do país como “Tropa de Elite” é indicador de interesse do brasileiro pelo filme nacional? O que quer dizer isso num contexto em que apenas 7% dos municípios brasileiros dispõem de uma sala de cinema?

 Como visualizar esta questão no confronto com uma realidade em que o documentário chegou a ocupar 40% dos lançamentos em cinema (em 2006) e, no entanto, o filme do gênero mais visto no país desde 1999 (“Pelé Eterno”, lançado em 2004 por Aníbal Massaíni, que contabiliza 254 mil pagantes) obteve pouco mais que 10% da bilheteria da ficção que ocupa apenas o 10º. lugar no ranking das mais assistidas desde 2000 (“Xuxa Popstar”, de Paulo Sérgio de Almeida e Tizuka Yamasaki, que teria somado 2.394.326 pagantes)?

 Talvez seja este, justamente, seu maior desafio: desvendar não apenas a nova cadeia produtiva do audiovisual, mas o novo público, feito de cidadãos audiovisuais ativos, em tempos de implosão de lógicas, de pulverização das fontes de conteúdo, de trivialização do manuseio de equipamentos de captação e edição de imagens – por meio de câmeras de vídeo, fotográficas ou aparelhos celulares.

 Aos dilemas crônicos para se alcançar a sustentabilidade do cinema como negócio, somam-se agora novas encruzilhadas, escancaradas pelas muitas janelas de exibição que se apresentam, seja nas redes sociais da web 2.0 (como YouTube), nos dispositivos móveis (celulares, aparelhos de mp4) ou na televisão digital, que nos bate à porta.

 A Mostra CineBH 2007 foi um espaço privilegiado para refletir e entender o cinema que se fez e que se faz. E para ajudar a tatear com mais firmeza isso tudo que virá.