De 25 de setembro a 9 de outubro, um recorte especial da 18ª CineBH – Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte estará disponível na plataforma Itaú Cultural Play.

UM RECORTE DE FICÇÕES DO EU

A curadoria de curtas e médias da Mostra CineBH selecionou para a plataforma do Itaú Play deste ano um recorte de filmes bastante especial, pois, em nossa programação “master”, isto é, em nossos quatro programas de curtas-metragens brasileiros, a serem exibidos em Belo Horizonte, entre os dias 24 e 29 de setembro, está imposta uma questão fundamental: o que pode um curta-metragem hoje? Essa pergunta, bastante complexa, serve de baliza para nos aventurarmos no reino das ficções de filmes brasileiros contemporâneos – filmes que procuram criar um universo, filiar-se a um mundo inconfundível, criando assim aspectos, características e liames particulares para a construção de seus universos.

Mas há, nessas quatro sessões, apenas uma que não é dedicada estritamente a trabalhos ficcionais, justamente por entendermos que, mesmo partindo de filmes documentais, há uma leva importante de trabalhos que interditam memórias de si para criarem viagens, caminhos e abordagens que, muitas vezes, assemelham-se muito mais a uma poética particular que a um mero registro formal da realidade. Ou seja, são (alguns) filmes documentais, mas desenhados e recriados com alguns princípios imaginativos de derivas ficcionais. São esses os filmes que o espectador do Itaú Play poderá prestigiar.

De Minas Gerais, temos Junho de 2002, de Tainá Lima, que se propõe a ser uma espécie de biografia da cineasta, ao passo que faz dessa biografia um grande aglomerado de referências e diálogos do diretor com o espectador, por meio de interações em texto que interrompem e entrelaçam as imagens em tela que acompanham sua narração.

Do Amazonas, Ri Bola, dirigido por Diego Bauer, equilibra-se entre o registro documental da pandemia e o olhar afetuoso para o amigo, em uma estrutura cênica que muito bem concatena os dois polos principais da arte dramática – o riso e o choro, a comédia e a tragédia.

Já o curta-metragem A Última Valsa, de Fábio Rogério e Jean-Claude Bernardet, de São Paulo, traz imagens do célebre pensador do cinema brasileiro a partir de recortes de filmes anteriores de que ele participou, em tom de elegia, cauterizados por um preto e branco que nos faz refletir sobre os limites entre vida e morte – é uma espécie de documentário, sim, mas um documentário de imagens de outros materiais, com tentativas de criação de cenas e situações, circunstâncias que cruzam a vida e o balé de experiências de Bernardet.

O paraibano Mar-Pedra-Rio, dirigido por Mariah Benaglia, por sua vez, é fruto de experiências com imagens analógicas e traça uma relação bonita entre os caminhos geográficos e os caminhos do corpo, a partir dos passos da família Pedroza/Ribeiro, realizados entre 1927 até os dias atuais. É um trabalho que possui na dança de suas imagens sua força, em capturas de situações que se misturam com os traços do corpo e da natureza, traçando meandros entre esses dois hemisférios distintos e ao mesmo tempo fortemente conectados.

Ao fim, o filme Roberto Baggio, de Henrique Cartaxo, de São Paulo. Um trabalho que parte de figuras e imagens canônicas, em especial o craque italiano Roberto Baggio – responsável direto pelo tetracampeonato mundial da Seleção Brasileira em 1994 – para fazer delas dispositivo documental para que se construa uma ficção de si: a imagem do mito surge como disparador para o cineasta, mas a partir dela ele pode acessar as partes mais íntimas de suas subjetividades, manipulando a história de seus tempos e entrecruzando-se com elas.

Além disso, temos também outros dois trabalhos de fundamentação ficcional que compõem a seleção da plataforma Itaú Play este ano. Habitar, de Antônio Fargoni, de São Paulo, e Soneca e Jupa, de Rodrigo R. Meirelles, de Minas Gerais. Nesses dois filmes, a juventude é o ponto central, trazendo protagonistas em idade de maturação que, aos poucos, deparam-se com momentos e situações divisórias em suas vidas. São filmes que se misturam com as ficções do eu, justamente por darem materialidade e encenação a vivências tão proeminentes de uma juventude à flor de pele.

Mas esse, claro, é apenas um pedaço daquilo que propõe a programação de curtas da CineBH. De toda forma, ele também nos capacita a visualizar algumas das tendências mais fortes da realização de curtas-metragens contemporâneas no Brasil.

Marcelo Miranda
Rubens Fabricio Anzolin

Curadores